De suspeita em suspeita, se chega a uma incerteza - ruminei mordendo os lábios como se fosse arrancá-los. Ou seria ao contrário? Uma mosca azul-metálica me ensinou como combater a repugnância das pessoas: pouse em sua sopa. Olhei para o prato. Intacto. Um bote de ideias frescas descansava frio e transparente sobre a mesa. Peguei a colher e comecei a remá-lo. Fiquei ali um bom tempo perguntando-me se devia ignorá-lo ou se devia bajulá-lo e engolir de imediato aquele amontoado de bravatas que o prato acabara de me propor. Da última vez que me deixei engolir, esqueci a sabedoria do sabor. Pensei comigo mesma que qualquer coisa que pudesse explicar aquela amargura em minha língua, merecia uma tentativa. Olhei sem vontade para o prato. Pensei na sopa. E pensei em mim. Mas pensei, sobretudo, em todas aquelas pessoas que me diminuíram quando cruzaram o meu caminho. Concluí que não era a sopa, eram elas quem não me desciam. A sensação ruim que o meu encontro com o que elas eram e o que haviam se tornado, foi decisivamente o que deixou em minha boca aquele gosto amargo. Talvez isso explicasse o fato de eu ter me distanciado. Olha aqui nas minhas mãos: isso é um calo! E registre: orgulhoso, porque tive que dar um duro danado para conquistá-lo. Como se estivesse procurando ouro no fundo, continuei remando aquela sopa rala de palavras, convicta de que eu encontraria nela todas as indicações necessárias. E só o fiz para rastrear o exato instante em que deixei de respeitar a minha fome para matar a dos outros. Não tinha notado que seus egoísmos deixaram o meu prato minguado. Foi mais do que isso. Meu prato estava vazio. Tudo o que sabia era que precisava conseguir mais comida e se eu iria ou não repartí-la, isso também já não estava importando. Mas por que não? - vocês devem estar se perguntando. Todo porco tem seu chiqueiro - pontuei completando: o que eles aumentaram no peso, eu aumentei no tamanho.
Pipa
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