Aprendi com o tempo das fugas e com o resultado de cada uma delas que podemos adiar o encontro do nosso olhar com os olhos perturbadores da dor, mas não tem jeito: em algum quarteirão da vida, eles vão se encontrar. Por isso, agora, toda vez que acontece, escolho ficar em casa. Escolho encarar de uma vez. Mergulho inteirinha, protegida com o escafandro da fé e do amor que me habitam.
Dor adiada é dor acumulada, apenas isso, é o que aprendi comigo. É o que aprendi com as dores. E a vida é tão mágica que, lá no fundo mais fundo do oceano nada pacífico de cada uma delas, lá no instante ou quase em que a pilha da lanterna acaba, a gente descobre um jeito novo, muito lindo, muito nosso, comovente muitas vezes, para conseguir emergir e transformar o que parecia impossível de transformação. E não é exagero dizer que geralmente emergimos mais corajosos. Mais ternos. Mais bondosos. Mais nós mesmos. Mais conscientes do que, de verdade, nos importa. Com mais urgência de nos sentirmos felizes na nossa própria pele.
No fundo mais fundo, não é raro nos sentirmos sozinhos. Estamos doendo tanto que, pra começo de conversa, a nossa própria presença nos falta, isto que é a mais perigosa solidão. Mas é um engano temporário, comum nos tempos em que os nossos olhos estão embaçados demais pelo medo: tanto faz o aparente e transitório tamanho da solidão, não estamos sozinhos nunca. E não estamos mesmo.
O amor, não importa de que forma se manifeste, encontrará maneiras para nos tirar lá desse lugar com recursos às vezes inimagináveis. Podemos estar tão cansados pelo breu que não conseguimos perceber num primeiro momento, nem num oitavo, nem num trigésimo, o convite da luz. Mas, de um jeito ou de outro, o amor que nos habita não cansará de tentar. Ele não foge pela porta dos fundos.
Ana Jácomo
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