Sejamos menos por dentro, então. O que é que está para fora? Nada. Eu, que calo quando olho pra frente, procurando o fim da estrada, infinitamente, não vejo nada. Sejamos o nada então, essa troca de vazio numa mesa de bar, o tão pouco pra falar, o sinto muito quando não dá, o certo pelo avesso, a blusa mal passada, o nada, enfim, o nada. Como o previsto, rasgou no joelho aquela calça, quebrou a taça, mofou a terra daquela antes flor e agora nada, um ainda caule, um quase troço, atrofiado no embaraço de ainda querer ser flor. Mas acabou, olha o tempo como tá. Olha pra fora, o que é que está para fora? É preciso olhar. Alguém aqui vê o mundo girar? Vê o vento passar? A janela bater? Não adianta trocar o canal, virar o disco, jogar fora o lixo, todo o lixo separado em sacolinhas plásticas. A porra da areia do gato está sempre suja, a louça pegajosa, o ralo no talo. Vou contar uma coisa que me aconteceu: brotou ontem, do mofo, uma coisa estranha, parece bicho, morto, torto, sem alma, totalmente calado, não dá pra saber o que é, mas é alguma coisa. Alguma coisa sempre é. Entediados, os paulistanos, estão sempre procurando achar alguma coisa estranha, assim, do nada, como quem procura no ninho, um peixe, ao invés de um passarinho. Eu prefiro os pássaros, mas sou paulistana, cravada no concreto, decerto, com uma vida que passa rápido demais, enchendo-me de informações mal processadas e durex para grudar o que não deu certo, tapando buracos, formando vácuos, criando eco, esvaindo o nada e deixando de lado o quase, adaptando-me, então, à podridão, à plenitude. Fujo? Não, tento me recortar para caber em caixas. A mudança está próxima, preciso caber numa carreta. Caminhão sai caro demais.
Giovanna Zambianchi
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