...Eu já tive todos os sonhos do mundo suficientemente acomodados dentro de mim. E cuidava de cada um com todo zelo que tinha. E alimentava-os com esperanças renovadas. Até que um dia, sem alternativa, perdi-os. Culpei-me amargamente por isso. Destruí os estoques que tinha para nutri-los. Queimei as garantias de que seriam possíveis. E esvaziei-me. Sacudi os restos. Caíram por aí. Vez por outra cato algum. Mas já não se acomodam como antes. Mudaram. Devem ter alimentado outra coisa além das minhas esperanças. Devem ter nutrido outros sonhos. Algo que eu já não poderia fazer porque me acostumei à dieta dessas migalhas sem sabor que apenas sustentam uma vida sem sonhos. E ainda assim, lembro-me da fartura. Do tempo que eram meus. Do tempo que eram possíveis. Hoje, estão perdidos por aí. Nutridos. Ou quem sabe, famintos. Não sei. Não tive notícias. Só tenho lembranças. Talvez não tenham sido tão meus. E me finjo de estranha. Só por não ter coragem de tê-los de novo.
Ivanúcia Lopes
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