Sou uma eterna apaixonada pela vida e pelos seres humanos, a fonte de surpresas que Deus manda a nós atiça ainda mais a minha sede de conhecer um mínimo da sua pluralidade...
Ninguém conhece ninguém e a verdade é incontestável, podemos observar isso nas trombadas com o cotidiano. Uma descarga hormonal ou emocional muda severos comandos pessoais, modifica o curso da vida, ciclos então nem se fala e por aí vai...
Essa multifacetagem humana me fascina e desobriga de julgar ou condenar a mim e muito menos os meus pares, no balanço desordenado da inquietude de ser, de ser mutável perante todas as formas e situações. Se o homem amasse o seu próximo um centésimo do que ele se ama, o mundo seria um paraíso sem precisão de reformas ou retoques.
Somos absurdamente condescendentes para tratar dos nossos próprios defeitos e limitações, porém a nossa voracidade se faz a mais presente quando empenhada para tripudiar e atacar as falhas alheias. Falhas estas que invariavelmente só as enxergamos porque também as possuímos.
Sempre encontramos uma forma de nos perdoar, uma forma de na verdade justificar uma falha, com o péssimo pretexto de não admitir nossos deslizes por inteiro. E não adianta pagar o desabafo nos divãs, uma vez que ficou longe o tempo de lavar a alma na graça dos confessionários...
Refletido em águas límpidas ou no espelho, jamais admitimos algum exagero nas formas do corpo, um traço mal acabado sem pensar: o outro está pior... Somos fiscais auto-nomeados dos conhecimentos diários, juramos que resolveríamos os problemas do mundo se estivéssemos em posição de destaque e consideramos um absurdo o sucesso do João ou do Pedro não ser o nosso. Pregamos a caridade com o chapéu alheio acreditando comodamente nas melhores condições do semelhante. Damos aulas de moral com propriedade, reinventamos conceitos e valores, julgamos setenta vezes sete, justificando e santificando-nos na mesma proporção.
Se a autocrítica vingasse no meio da sociedade impiedosa onde crescem o egoísmo, a sede de dominar, o culto a si próprio, muitos problemas seriam minimizados. Na verdade, acredito que a grande maioria dos problemas estariam resolvidos...
Quando nos colocamos na condição de críticos ambiciosos e não nos “criticamos”, arriscamos a nossa dignidade, o sossego, a harmonia, a estabilidade... Nossas atitudes provém do nosso estado de espírito, não podemos nos redimir a mediocridade das coisas materiais, da pessoas banais e dos valores artificiais.
Hoje em dia, chega a ser heróico abaixar a crista, reconhecer limites, aceitar críticas, porque o ego do homem moderno extrapola as suas dimensões. E porque de não reconhecer e aceitar nossas falhas? Somos falhos a todo o momento e não devemos julgar o próximo nunca, uma vez que podemos ser tão falhos ou pior do que ele... Precisamos aceitar a nossa imagem, por dentro e por fora... Essa aceitação geraria um alívio para as angústias, cobranças e tensões...
O tempo passa e não poupa, deixa desgastes sem distinção, pura ilusão a nossa se continuarmos a viver o lado superficial e artificial da arte da vida... Esse teatro diário que Deus criou, com caras e bocas, frases e rimas, músicas e dança... Somos tão completos, vamos nos amar e respeitar mais??
E afinal, porque o título do texto foi escolhido como Complacência?? O que é complacência??
Complacência segundo o dicionário, “pai dos burros” mais informalmente conhecido (rs), quer dizer benevolência, comprazer, condescendência...
Precisamos ser humildes e complacentes sempre e acima de tudo nos perdoar, perdoar e aceitar o nosso “irmão” semelhante... Não podemos simplesmente nos acomodar, achando sempre que o outro estava errado, pensando se tivéssemos feito isso ou aquilo, mas, que “fulano” não fez o que deveria... E no nosso cotidiano, como lidaríamos com as perdas?? Julgando sempre?? Deus nos ama independente de nossas falhas, tem misericórdia e nos perdoa mesmo nos nossos piores pecados...
Eis algumas perguntas que nos levam a identificar as perdas ocorridas em nosso cotidiano:
_ O que fazer: quando estava tudo programado para dar certo e, de repente, pintou aquela “zebra”?
_ O que fazer: quando as certezas se transformaram em promessas falsas e utopias?
_ O que fazer: quando alguém insiste em ser um detrator na posição de um grande amigo seu?
_ O que fazer: quando todas as suas forças já se esgotaram no sentido de perdoar os erros do outro?
_ O que fazer: quando o mundo parece não ouvir as suas observações e os seus pedidos de mudança?
_ O que fazer: quando, inesperadamente, surge uma doença grave na sua família?
_ O que fazer: quando todo mundo ao seu redor só quer ganhar e continuar rindo do seu longo período de más influências?
_ O que fazer: quando você reconhece aquela pessoa que, indubitavelmente, age como um “lobo fantasiado de cordeiro”?
_ O que fazer: quando morre uma pessoa da qual você julga receber uma proteção quase que divina?
_ O que fazer diante de todos os percalços da vida?...
É preciso apenas SORRIR, mesmo forçadamente, para que se inicie o processo de interações com o universo, dando espaço para o exercício de um lado, aparentemente oculto, do ser humano: a COMPLACÊNCIA.
By Flor